quinta-feira, 20 de março de 2014

DIAS DOS PAIS



DIA DOS PAIS

Entre tantas datas comemorativas, o dia dos Pais é mais uma que festejamos sem que tenhamos a menor sensibilidade sobre o que realmente estamos comemorando. Por um lado, a sociedade segue o protocolo estabelecido por um marketing maciço que visa somente lucros com a venda de presentes. E nós, filhos e filhas? Festejamos verdadeiramente o fato de ter tido o pai que tivemos? Será? Será que somos filhos de um pai que idealizamos ou somos aqueles filhos que o desafia e o enfrenta sempre que nossas expectativas não são satisfeitas? Por outro lado, será que nosso pai sente orgulho de ter a família que constituiu ou é daqueles que até hoje mantêm um relacionamento contrariado por “ter” sido pai sem querer?

            Muito cedo descobri que tinha um pai ausente e distante de qualquer data comemorativa do tipo que precisa passar com a família. Vivi muitos conflitos, clamei por atenção e cresci olhando de lado o homem que me deu a vida, pois de frente viviam pais que davam o exemplo participando dos estudos de seus filhos, lazer, sonhos. Menos o meu.

            Entretanto, tive a sorte de passar algumas férias com ele, tempo suficiente para saber que ele era um homem especial, que dando apoio ou não, vivendo comigo ou não, dividindo sua atenção ou não, vivemos uma conexão que me ajudou a olhar a vida com mais otimismo. Mas aquele foi um dia terrível em que uma voz estridente disse: “Então não precisa mais me considerar como pai”. Como assim? Só porque preciso da sua ajuda e não quero fazer o que você pede? Tenho uma vida e nela colocarei minha atenção e, se para isso, tiver que ir embora, irei.

            Trinta anos se passaram sem que encontrasse uma única oportunidade para dizer o quanto aquelas palavras me machucaram, mas ao mesmo tempo, me transformaram em alguém mais corajoso e independente. Pensei muitas vezes chamá-lo para uma conversa e dizer o quanto foi ruim viver com essa lembrança, mas acabei pensando que não valeria a pena já que tudo havia mudado, muitos anos haviam passado. Essa coisa mal resolvida do passado ficou lá atrás porque não tive coragem para começar um diálogo como esse que estou fazendo agora, no presente.

            Mas por que exatamente agora? Ele já se foi e as oportunidades também. Sei que ele deve ter contemplado lembranças da sua infância sofrida, como estou contemplando a minha agora, mas a emoção que sinto não poderá mais chegar até ele. Assim como eu, sei que ele também controlou suas emoções durante anos para se fingir de forte dizendo que “homem que é homem não chora”, então eu também não vou chorar.

            Se eu pudesse rebobinar o tempo e tivesse uma única oportunidade de ver meu pai com cinquenta anos, talvez eu lhe dissesse algumas verdades sobre seu comportamento, mas também diria sem pestanejar que o amo e nada daquilo que eu disse que ele fez e me magoou ou não fez porque não podia, mudaria esse amor que tenho dentro de mim. Já me perdoei por ter-me deixado ser magoado por um punhado de palavras que queriam dizer o quanto eu era amado e, também, pela oportunidade de perceber que seu passado provavelmente deve ter sido prá lá de terrível. Tê-lo perdoado não significa que concordo com sua ausência, mas me abriu a mente para conhecê-lo melhor sem qualquer julgamento da minha parte.

            Se você é aquela criança que cresceu desamparada pelo pai e, por isso, não o valoriza por qualquer razão, agradeça pelo menos por estar vivo e saia do seu interminável silêncio para tomar a direção de uma vida mais aberta com seus filhos. A gratidão não deve ocorrer somente no dia dos pais, mas todos os dias do ano para que através dessa ação, possamos demonstrar um ato de carinho verdadeiro com a gente mesmo. Mas se tiver alguma pendenga para acertar, não espere um só minuto. De uma hora para outra, “puff”, a vida se vai e você jamais saberá o quanto ele pode ter-se envergonhado de não ter feito mais, construído mais, oferecido mais do que um dia você esperou, só para que você pudesse ter um pouco de orgulho dele e dizer: “Este é o meu pai”.

            Hoje compreendo suas atitudes e queria poder dizer a ele que o fato de ter-me dito um dia “então não precisa mais me considerar como pai” foi uma grande mentira, um ato de desespero porque seu coração de matuto não sabia dizer: “Meu filho, estou preocupado porque não posso ajudá-lo como eu gostaria, por isso estou agindo dessa maneira”. Se pudesse voltar no tempo, também diria que eu o escolhi para ser meu pai e que o será sempre, porque eu decidi isso, porque eu o escolhi apesar de todos os seus defeitos, ausências e desencontros. Apesar de ter-me proibido de considerá-lo, eu hoje o compreendo, pois sei que o seu desespero foi maior do que a sua própria ignorância.

            Mas você que lê esse artigo, se tiver algo a ser resolvido com seu pai e oportunidade para resolver, não perca a chance, isso é uma das coisas na vida que ninguém tira vantagem, mas pode ser uma das experiências mais gratificantes que podemos nos dar de presente no dia que celebramos o Dia dos Pais. Lembre-se que um dia você pode ter dito: “Pai, não se meta na minha vida”, mas a verdade é implacável e talvez você nunca saiba a resposta que ele tinha para lhe dar: “Filho, eu não me meto na sua vida, é você que se meteu na minha”. Sabe por quê? Porque ele o respeita mais do que tudo na vida.

Getúlio Gomes
Pós Graduado em Gestão Financeira e Gestão Estratégica de Pessoas para Negócios, Psicanalista, Trainer em PNL e Coach Sistêmicos, consultor, palestrante, autor do livro “Sai desse corpo que não te pertence – Uma maneira divertida de exorcizar a autossabotagem”. Email: getulio.consultor@terra.com.br.

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